Como evitar o ataque por cloretos em edificações próximas ao mar

Marina Nascimento Silva

Escrito por Marina Nascimento Silva

24 de abril 2020| 10 min. de leitura

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Como evitar o ataque por cloretos em edificações próximas ao mar

Ataque por cloretos: Intuitivamente você, assim como eu, sabemos que as maiores concentrações populacionais, e por consequência de construções, estão distribuídas ao longo do litoral brasileiro. Isso se deve a um processo histórico de descoberta, ocupação e exploração que se iniciou na região litorânea do país.

Segundo o atlas geográfico das zonas costeiras e oceânicas do Brasil , divulgado em 2011 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a necessidade de escoar as matérias primas aqui exploradas para o mercado de consumo europeu, bem como a necessidade de manter o domínio da costa protegendo-a de ocupações inimigas, contribuíram para isso. Essa dinâmica, juntamente com as condições naturais, determinaram a distribuição que temos atualmente.

A atmosfera marinha já é, por natureza, um ambiente mais agressivo as construções. Isso se deve a presença de sais dissolvidos, como o íon cloreto, que atingem a edificação diretamente por via da maré/ respingos de maré ou indiretamente por meio da névoa marinha.

A ocupação intensiva da área litorânea contribui para o agravamento da situação pelo grande volume de contribuição de esgotos e poluição atmosfera que podem potencializar a ação agressiva deste ambiente, seja pelo lançamento direto ou indireto desses resíduos nos recursos hídricos.

Uma noção numérica quanto a densidade demográfica pode ser observada no mapa abaixo, divulgado em 2011 pelo IBGE. Nota-se que as maiores concentrações populacionais, com densidades demográficas acima de 100 habitantes/km², estão ao longo do litoral brasileiro ou áreas próximas. Concordando com isso, temos um grande volume de construções na zona costeira.

ataque por cloretos: imagem mostra gráfico com percentual de área e população de municípios da zona costeira e demais municípios do Brasil - Fonte de 2010
(Fonte: IBGE, 2011)

Manifestações patológicas decorrentes do ataque por cloretos

Uma edificação é formada por diversos componentes: fundações, estruturas, vedações, esquadrias, instalações, acabamentos, etc. Para garantir um bom funcionamento do todo, é fundamental promover um bom desempenho a cada um deles individualmente, evitando manifestações patológicas.

As manifestações patológicas que acometem as construções relacionam-se diretamente com a durabilidade, vida útil, segurança, conforto e estética das edificações, sendo de relevante preocupação tanto nas mais recentemente erguidas quanto nos prédios antigos.

Quando tratamos, especificamente, de ocorrências patológicas associadas a durabilidade, vida útil e segurança, as fundações e estruturas de concreto armado são os componentes que exigem maior atenção.

Os problemas em estruturas de concreto podem ser provenientes dos defeitos intrínsecos dos componentes individuais, das variações volumétricas de origem térmica, da retração hidráulica ou da ação de agentes externos.

Nesse contexto, as condições de exposição ambiental as quais a edificação está submetida, como a atmosfera marinha e seus agentes agressivos, tornam-se particularmente importantes nas discussões.

É na atmosfera marinha que se dá o ataque por cloretos, responsável por manifestações patológicas em forma de trincas que além de prejudicar esteticamente os elementos também conferem sensação de desconforto ao usuário.

Essas aberturas são decorrentes do processo de corrosão do aço que gera produtos altamente expansivos. O aumento de volume ocasiona trincas e eventuais destacamentos da camada de concreto de cobrimento.

ataque por cloretos: imagem mostra corrosão do aço com trincas e destacamento no concreto
(Corrosão do aço com trincas e destacamento no concreto)

Além disso, também ocorre perda da seção do aço, que compromete o desempenho estrutural da edificação.

Durabilidade e vida útil das edificações

Como você leu acima, a ação de cloretos sob estruturas de concreto afeta sua durabilidade e vida útil, dentre outros aspectos. A definição desses conceitos está descrita na ABNT NBR 6118: 2004 conforme segue.

  • Durabilidade: consiste na capacidade de a estrutura resistir às influências ambientais previstas e definidas no início dos trabalhos de elaboração do projeto;
  • Vida útil de projeto: entende-se o período de tempo durante o qual se mantêm as características das estruturas de concreto, desde que atendidos os requisitos de uso e manutenção prescritos inicialmente, bem como de execução dos reparos necessários decorrentes de danos acidentais;

Conforme a ABNT NBR 6118: 2004 o conceito de vida útil aplica-se à estrutura como um todo ou às suas partes. Dessa forma, determinadas partes das estruturas podem merecer consideração especial com valor de vida útil diferente do todo.

Armaduras

A ABNT NBR 7480: 2007 classifica os aços para armaduras de elementos estruturais de concreto armado em barras e fios.

As barras compreendem as categorias CA-25 e CA-50, tem bitola superior a 6,3 mm e são obtidas por laminação a quente. Os fios, em contrapartida, são obtidos por trefilação ou laminação a frio, tem diâmetro nominal inferior a 10 mm e compreendem a categoria CA-60.

As nomeações CA-25, CA-50 e CA-60 indicam o tipo de concreto (armado, no caso) e a resistência ao escoamento do aço.

Corrosão das armaduras

O concreto é formado por:

  • Aglomerante Hidráulico – Cimento;
  • Água;
  • Agregados miúdo e graúdo – Areia/ Brita; e eventualmente
  • Aditivos – Incorporadores de ar/ Plastificantes/ Modificadores de pega, etc.;

Nessa composição, a mistura endurecida resiste bem aos esforços de compressão.

Para conferir também resistência a tração são adicionadas barras de aço de bitolas e características variadas. O conjunto aço + concreto é chamado de concreto armado.

ataque de cloretos: ilustração representa a compressão e tração em viga bi apoiada
(Compressão e tração em viga bi apoiada)
ataque por cloretos: ilustração representa a compressão e tração em engastada
(Compressão e tração em engastada)

O aço empregado no concreto para conferir-lhe resistência a tração é passivo as reações de corrosão, pois está imerso em um meio alcalino (com pH em torno 12,0). Essa passivação é data por uma película de óxidos que revestem sua superfície.

O concreto é naturalmente alcalino em razão do hidróxido de cálcio resultante da hidratação do cimento. O aço em seu interior é então estável a corrosão em condições normais.

A presença de íons cloreto, entretanto, desestabiliza a camada passivadora, tornando-a mais permeável e permitindo que a corrosão se estabeleça mesmo em um ambiente alcalino.

Ambiente marinho

O ambiente marinho apresenta alguns agentes que atuam prejudicialmente as estruturas de concreto armado.

Entre eles podemos citar os agentes físicos como a ação das ondas/variação da maré e ventos. Quantos aos agentes químicos temos os sais cloretos dissolvidos na água do mar.

A Norma ABNT NBR 12.655: 2015 traz as recomendações abaixo indicadas para teor máximo de cloretos no concreto para a proteção das armaduras.

ataque por cloretos: tabela - teor máximo de íons de cloreto para proteção das armaduras de concreto
(Fonte: ABNT NBR 12655, 2015)

Cabe destacar que além do ambiente externo, foco deste artigo, os cloretos também podem estar incorporados a mistura em razão do uso de agregados contaminados e certos tipos específicos de aditivos.

Quando proveniente de ambiente externo/ atmosfera marinha, diferentes estudos citam os fatores abaixo como influentes no grau de contaminação por cloretos.

  • Direção do ventos predominantes;
  • Distância em relação ao mar;
  • Altura em relação ao mar;

Cobrimento

O cobrimento pode ser definido como a espessura de concreto que reveste o aço no interior do concreto, protegendo-o do ambiente no qual está inserido.

É a espessura do concreto de cobrimento, juntamente com a qualidade do mesmo, que evita que agentes agressivos externos como os cloretos atinjam a armadura.

A ABNT NBR 6118: 2004 considera, para a estrutura como um todo ou suas partes, as classes de agressividade contidas na tabela abaixo.

tabela classes de agressividade ambiental
(Fonte: ABNT NBR 6118, 2004)

É a partir da classe de agressividade ambiental assumida na tabela acima, juntamente com o tipo de estrutura e componente/elemento, que se obtém o cobrimento nominal utilizado em obras correntes através da tabela mostrada abaixo, obtida da ABNT NBR 6118: 2004.

tabela classes de agressividade ambiental
(Fonte: ABNT NBR 6118, 2004)

Conclusão

Pelos argumentos acima expostos podemos resumir que para evitar o ataque por cloretos em edificações próximas ao mar devemos:

  • Adotar uma espessura adequada de cobrimento, considerando a peça na qual será empregado o concreto, o tipo de concreto e o ambiente ao qual o mesmo será exposto. Tudo isso seguindo as instruções normativas especificadas;
  • Utilizar um concreto de boa qualidade, com baixa permeabilidade, por exemplo, para evitar o ingresso de agentes agressivos;
  • Durante a fase de projeto, pensar em uma locação da construção no terreno que minimize sua exposição aos agentes agressivos;

Pinturas/revestimentos anticorrosivos também podem ser usadas na superfície das barras de aço como método de proteção.