Podemos agilizar a formação de engenheiros para 2 ou 3 anos?

Luiz Henrique Ceotto

Escrito por Luiz Henrique Ceotto

30 de outubro 2017| 9 min. de leitura

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Essa questão levantada num artigo, muito bem escrito, no LinkedIn semana passada me chamou a atenção.

Infelizmente não anotei o nome do autor e perdi o artigo no rolar dos assuntos desse site. O autor comentava da necessidade de aumentarmos a produtividade do ensino com técnicas mais modernas ao invés de obrigar o aluno ficar 5 anos na universidade em aulas expositivas, chatas e de conteúdo puramente acadêmico.

Grande parte do comentários postados “caíram de pau” em cima do autor, dizendo ser impossível e temerário formar um engenheiro em tão pouco tempo, e que isso iria na contramão do que se está se fazendo na medicina, por exemplo.

Produtividade na formação de engenheiros

Falamos de produtividade em tudo quanto é atividade, mas pouco da produtividade na formação de engenheiros.

Se o problema que queremos resolver é: como capacitar engenheiros com suficiência no menor tempo e custo possível, estamos falando em produtividade no ensino da engenharia. Nesse entendimento, seguem algumas questões que pude formular e que espero contribuam na solução da questão:

1 – Os currículos não estariam precisando de uma modernização?

  • A ênfase na quantidade das disciplinas para cada área da engenharia reflete a demanda real do mercado de trabalho? Será que o conteúdo das disciplinas não está mais voltado as atividades de projeto (dimensionamento) do que nas de gestão da produção? Sabendo-se que as atividades de projeto não chegam a absorver 5% dos profissionais de engenharia, mas suas disciplinas chegam a ser 70% do currículo, não haveria um contrassenso nisso?
  • As disciplinas do curso básico nos 2 primeiros anos (matemática, física e química) tem seu conteúdo realmente voltados para as disciplinas profissionais? São ministradas por engenheiros ou por teóricos sem vínculo com a engenharia? As disciplinas não estariam muito distantes das disciplinas profissionais que as utilizarão como base?
  • O conteúdo de habilidades humanas tais como organização do trabalho em equipe, comunicação, avaliação, métrica de desempenho, feedback, etc., são abordados em algum ponto do currículo? Esse conteúdo é considerado importante numa profissão que basicamente lida o tempo todo com trabalho em equipe?
  • A quantidade de disciplinas e horas-aula não está sendo desproporcional e baseanda na crença que o aluno só aprende aquilo que o professor fala? O aluno tem tido tempo suficiente para atividades extraclasse, tais como estudar, participar de seminários e eventos profissionais, além de estágios?

2 – Aulas não deveriam ser focadas no aluno ao invés de no professor?

O que é considerado hoje uma boa aula? Uma aula expositiva, onde o professor se esforça para manter a atenção dos alunos por 2 a 4 hora,s ou formas mais produtivas e menos enfadonhas? O que fazer para captar a atenção dos alunos e tornar uma aula interessante e estimulante? Será que não existem formas mais produtivas de se aprender do que as tradicionais aulas expositivas? Como exemplo de sucesso, o MIT divide as disciplinas em 3 fases:

  • A primeira fase é chamada “Preclasse”, onde livros, artigos e palestras (pela internet) deveriam ser lidos e assistidos pelo aluno de modo a adquirir os conhecimentos básicos das disciplinas.
  • A segunda seria o que os americanos chamam de “Assessement” onde o aluno demostra que tem os conhecimentos básicos para poder participar das aulas presenciais.
  • A terceira fase seria as aulas presenciais, com conteúdo expositivo mínimo, mas com fartos debates, trabalhos em grupo, discussão de casos reais e atividades práticas de campo.

Essas 3 fases fariam que os alunos aprendessem a aprender, aumentassem a capacidade de trabalho em grupo e fariam com que os alunos fossem fortemente centrados no seu aprendizado, e não expectadores como atualmente.

3 – Não seria interessante implantarmos uma certificação progressiva?

  • Nos dias de hoje, será que não é antieconômico e pouco produtivo um aluno ter que esperar 5 anos para poder atuar profissionalmente?
  • Mesmo para a classe média, não está cada vez mais difícil manter um filho estudando por tanto tempo sem que ele possa ganhar seu sustento?
  • Formação de engenheiros de 5 anos não é muito dispendioso e lento para o financiamento escolar governamental (FIES)?
  • Atingindo-se boa produtividade no ensino, que certificação poderia ser dada a um estudante com 3 anos de formação? É claro que ele não estaria apto a gerenciar projetos complexos, ou mesmo projetar grandes edifícios ou pontes. Mas, será que os que cursaram os atuais 5 anos estão? Esses estudantes não poderiam coordenar equipes de trabalho de subcontratos numa grande obra? Projetar e construir edifícios pequenos e médios? Atuar como equipe de apoio em atividades de projeto? Trabalhar em atividades de controle de processos específicos entre outras?
  • Com certificações progressivas e cumulativas, com períodos mais curtos, esses profissionais não poderiam suprir a falta de técnicos capacitados nas obras e empresas e se sustentarem economicamente? Será que a grande maioria dos engenheiros que estão atuando hoje tem tantos conceitos como os que poderiam ser ensinados de forma produtiva em 3 anos?
  • Uma segunda fase de certificação poderia ser adicionada em mais 2 anos de estudos, onde o estudante seria capacitado para atuar em gerenciamento de projetos mais complexos e construções maiores. Isso é assim tão difícil de ser implantado?
  • Uma eventual terceira fase, para atuação em projetos de grandes obras ou em pesquisas tecnológicas, não poderia ser pensada? Imaginem 2 ou 3 anos dessa especialização serem adicionados a esse processo cumulativo.
  • Dessa maneira, ao dividirmos em 3 fases o processo de certificação dos engenheiros, não estaríamos atendendo a questão financeira dos jovens, as especificidades das áreas da engenharia em que cada um gostaria de atua? Não estaríamos aproximando a formação de engenheiros dada nas universidades das suas respectivas atividades profissionais?

4 – Podemos considerar os professores preparados para a formação de engenheiros?

  • Na formação de professores de engenharia é exigido qualquer capacitação em didática ou somente titulação técnica?
  • Os professores têm noção de como estruturar uma boa aula com debates, trabalho em grupo ou mesmo nas partes expositivas? Ou só conseguem montar aulas expositivas num monologo longo e enfadonho além de pouco produtivo?
  • Os professores só possuem titulação acadêmica ou também possuem experiencia profissional relevante para o ensino da engenharia?
  • As universidades incentivam as atividades dos professores fora do mundo acadêmico?
  • Como são os critérios de avaliação dos professores? Os alunos participam da avaliação das disciplinas?
  • Até quando toleraremos como normal o dito popular: “quem sabe faz, quem não sabe ensina”?

Muito mais perguntas poderiam ser formuladas, mas penso que se pelo menos essas forem respondidas e realmente solucionadas já teríamos um bom começo.

É importante complementarmos esse lote de perguntas com uma última: como essas perguntas seriam respondidas considerando-se um ambiente de cursos noturnos, os quais são parte importante dos cursos de engenharia?

Nos debates que participei o resultado final foi sempre o imobilismo. Perdura a posição que temos que concertar todos os problemas da educação do pais para podermos encaminhar minimamente a melhoria do ensino da engenharia. Precisamos decidir por prioridades para podermos ir em frente, e se possível de menor custo de implantação. As questões estão no ar…