O que é industrialização na construção e por que investir nisso?

Juliana Nakamura

Escrito por Juliana Nakamura

30 de agosto 2022| 18 min. de leitura

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O que é industrialização na construção e por que investir nisso?

Você sabe que a construção civil brasileira sofre com um problema crônico de produtividade. Construir mais em menor tempo, com custos previsíveis, sem comprometer a qualidade e a sustentabilidade ainda é um desafio gigante.
Para superar essa dificuldade, nos últimos anos, algumas práticas positivas foram adotadas. Entre elas, podemos citar a racionalização de processos e a mecanização das atividades no canteiro.
Só que transformar definitivamente uma realidade marcada por desperdícios, retrabalhos e falta de controles só é possível com a industrialização. Esse é o caminho a ser trilhado se quisermos atingir patamares de produtividade equiparáveis aos países mais desenvolvidos.
Saiba mais a seguir:

O que é uma construção industrializada?

A construção industrializada se dedica a transformar o canteiro de obras em uma linha de montagem, semelhante ao que ocorre em outras indústrias como a automobilística.
Para isso, baseia-se na aplicação sistemas pré-fabricados, que chegam ao canteiro prontos para serem montados.
Entre as vantagens dessa forma de produzir, podemos citar:

  • Otimização do tempo e redução do prazo de execução;
  • Ganho de qualidade, consequente de controles mais rigorosos na produção;
  • Uso de matérias-primas selecionadas;
  • Sustentabilidade, decorrente da diminuição do desperdício e da sujeira na obra;
  • Menor demanda por mão de obra;
  • Maior controle sobre os custos e sobre a execução;
  • Menos ajustes e improvisos;
  • Maior precisão geométrica;
  • Maior potencial de desmontagem uma vez terminado o ciclo de vida da edificação.

Como pensar em industrialização ainda na fase de projeto?

A industrialização na construção exige que os projetos sejam mais detalhados do que os usados em construções convencionais. Um fator importante visando a competitividade financeira dessa solução é tirar partido da padronização, da modularidade e da quantidade de repetições.
Atenção especial deve ser dada à fase de detalhamento da geometria das peças que irão ser produzidas na fábrica. Como várias das peças de uma estrutura têm um certo número de repetições, algum erro detectado apenas na fase de montagem pode implicar em perdas consideráveis.
Outro forte impacto do processo de industrialização nas obras acontece na logística do canteiro. A planta de produção deve ser pensada como uma linha de montagem, racionalizando-se distâncias de transporte dentro da obra, locais de armazenamento, etc.

Pré-moldado ou pré-fabricado?

Uma obra pode apresentar diferentes níveis de industrialização em função da concepção do projeto e a execução. Mas via de regra, uma obra é considerada industrializada quando utiliza sistema estrutural e vedações (internas e externas) constituídos por sistemas construtivos produzidos na fábrica.
Uma confusão que muitas vezes se faz é entre os elementos pré-fabricados e os pré-moldados, geralmente tratados como sinônimos.
A ABNT NBR 9.062/2006 – Projeto e Execução de Estruturas de Concreto Pré-moldado faz uma importante distinção entre esses dois conceitos. De acordo com essa norma:

  • Elemento pré-moldado – É todo aquele moldado previamente e fora do local de utilização definitiva na estrutura, executado conforme procedimentos de qualidade prescritos na ABNT NBR 14.931/2004 – Execução de estruturas de concreto – Procedimento, e na ABNT NBR 12.655/2015 –Concreto de cimento portland – Preparo, controle, recebimento e aceitação – Procedimento.
  • Já os elementos pré-fabricados, embora também sejam moldados previamente fora do destino final de uso, são executados industrialmente, em instalações permanentes de uma empresa destinada para este fim, com os devidos controles operacionais.

Construção seca

Atualmente, a indústria da construção oferece uma série de soluções industrializadas que podem substituir os processos artesanais, agregando agilidade, qualidade e economia. Confira a seguir alguns deles:

  • Drywall – Sistema para produção de paredes internas e forros. É composto por estrutura de aço galvanizado e chapas de gesso acartonado aparafusadas. Quando utilizam o sistema sanduíche (com duas chapas recheadas com lãs minerais), as paredes de drywall podem ter o seu desempenho termoacústico melhorado. Isso viabiliza sua aplicação, inclusive, em auditórios e salas de cinema.
  • Painéis arquitetônicos – Um dos principais ícones da construção industrializada, os painéis arquitetônicos são uma alternativa às fachadas tradicionais de alvenaria. As peças são pré-fabricadas em concreto armado e recebem, ainda na fábrica, revestimento incorporado em suas faces externas. Uma vez no canteiros, ao painéis são içados e fixados à estrutura por meio de inserts metálicos.
  • Painéis metálicos termoisolantes – São bastante empregados em obras industriais, especialmente para compor ambientes que demandam temperaturas controladas. Geralmente são confeccionados em aço, alumínio ou chapas de polímero perfiladas a quente com recheio isolante. A forma de instalação é parecida com a dos painéis arquitetônicos e emprega perfis ou encaixes tipo macho e fêmea metálicos.
  • Banheiro pronto – Consiste em módulos de concreto armado ou reforçado com fibras que chegam ao canteiro prontos (inclusive com louças, metais e revestimentos). No canteiro, os banheiros só precisam ser conectados às redes de água, esgoto e energia. São indicados em obras com grande grau de repetição, como em hotéis, por exemplo.
  • Estrutura de aço – A estrutura de aço, em substituição a elementos estruturais de concreto moldado in loco, permite transformar o canteiro em uma linha de produção. As peças são produzidas na fábrica em medidas específicas para atender ao projeto e chegam à obra para a montagem, normalmente feita com ligações parafusadas ou soldagem. Se quiser saber mais sobre o uso da estrutura de aço.
  • Estrutura pré-fabricada de concreto – Trata-se de uma solução cada vez mais utilizada em obras comerciais e industriais. Consistem em pilares, vigas e lajes de concreto que são produzidos em formas e dimensões variados. Esses elementos estruturais devem atender à NBR 9062: Projeto e execução de estruturas de concreto pré-moldado.
  • Steel frame – Baseado no uso de perfis de aço estrutural leve, esse sistema pode ser utilizado na construção de edifícios com até sete pavimentos, e como fechamento externo de fachadas para edifícios de múltiplos pavimentos.
  • Placas cimentícias – Fabricadas com cimento Portland, agregados finos e fibras sintéticas de reforço, substituem a alvenaria em obras executadas com estruturas convencionais ou com estruturas pré-fabricadas (metálicas ou de concreto). Podem ter formulações especiais para uso interno ou externo.
  • Wood frame – Sistema construtivo industrializado composto por frames confeccionados com perfis leves de madeira proveniente de florestas plantadas. Segundo dados da Tecverde, o wood frame pode reduzir em 85% a geração de resíduos na construção civil e diminuir em 90% o uso de recursos hídricos. Além disso, oferece alta velocidade de produção (é três vezes mais rápido do que alvenaria estrutural) com redução de mão de obra.

Como a industrialização da construção civil é utilizada na prática?

A industrialização da construção civil torna o processo construtivo diferente do convencional. Em vez de terem que produzir todas as etapas da obra, grande parte dos recursos chegam prontos. Os profissionais ficam com a função de montar e fazer a parte de acabamento.

Veja como a industrialização é usada:

  • as estruturas são pré-fabricadas antes de executar o projeto;
  • os processos são estruturados e sequenciais;
  • tecnologias de automação, inteligência artificial etc., são fundamentais.

Na prática, alguns processos são completamente eliminados. No levantamento de uma parede, por exemplo, não é necessário usar blocos, cimento, fazer massa etc. Uma chapa de drywall resolve a necessidade de uma parede de forma fácil, rápida, econômica e limpa.

Veja algumas das vantagens de utilizar a industrialização da construção civil:

  • agiliza a execução das tarefas e diminui o prazo de cada uma;
  • torna os controles de produção mais rigorosos;
  • reduz a demanda por mão de obra;
  • aumenta o controle dos custos e da execução da obra;
  • diminui os custos com desperdícios;
  • facilita na montagem e desmontagem;
  • aumenta a segurança no canteiro de obras;
  • promove a capacitação dos profissionais.

produtividade é um dos pontos mais levantados quando o assunto é industrialização da construção civil. Isso é uma grande vantagem para um setor que sempre teve foco em gerar empregos e não necessariamente em obter produtividade.

4 exemplos práticos de industrialização na construção

1. Parque da Cidade – São Paulo, SP

Industrialização Parque da Cidade crédito Carlos Gueller
O empreendimento é composto por cinco torres corporativas, uma torre de escritórios, duas torres residenciais com um total de 399 unidades, um shopping center com 22.400 m² de área bruta locável, um hotel e seis restaurantes.
  • Situação: No empreendimento da Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR), engenheiros e projetistas buscaram uma solução estrutural que abreviasse os ciclos de concretagem e reduzisse a quantidade de homens no canteiro. O projeto arquitetônico assinado por Aflalo & Gasperini previa vãos-livres de até 12 m.
  • Solução: A saída de melhor custo-benefício foi combinar pilares moldados in loco com fôrmas metálicas, vigas pré-moldadas produzidas em uma central instalada no canteiro e lajes alveolares protendidas pré-fabricadas. A obra acabou se transformando em uma grande montagem, com vigas e lajes sendo içadas por gruas. Para solidificar tudo isso, foi utilizada uma capa de 5 cm de concreto, deixando as lajes com espessura final de 26 cm.
  • Resultados: A construtora trabalhou com seis dias de ciclo de concretagem na execução da estrutura. Se utilizasse um sistema inteiramente moldado in loco, o ciclo seria de oito a dez dias. Também foi possível reduzir entre 30% e 40% o custo com mão de obra dedicada a essa etapa. Outros ganhos foram percebidos em função do melhor acabamento proporcionado pelos elementos pré-fabricados. A obra também registrou vantagens com o uso de banheiros prontos. Além da eliminação de custos indiretos, a solução permitiu reduzir 230 itens que seriam gerenciados pelo setor de compras e pelo almoxarifado a um único fornecedor.

2. Complexo hoteleiro Vitória-régia – Coari, AM

Em uma área de aproximadamente 100 km² foram construídos dois alojamentos de 1.386 m² cada, um prédio central com 2.035 m² e um edifício de recepção com auditório de 610 m². O objetivo era prover instalações confortáveis para os trabalhadores de um campo de extração de petróleo e gás natural, minimizando os impactos ambientais de sua construção ao máximo.

  • Situação: Em meio à Floresta Amazônica, a obra teve de lidar com situações especiais, como a falta de infraestrutura local e o clima tropical. Era condição primordial que as edificações pudessem ser desmontadas no futuro, uma vez que a produção dos campos de petróleo não é eterna.
  • Solução: Foram adotados nessa obra fundação com radier de concreto, estrutura em steel frame, fechamento externo com placas cimentícias, fechamento interno com drywall, e cobertura com telhas metálicas tipo sanduíche.

Durante dois meses, a equipe de engenheiros e arquitetos se dedicou ao desenvolvimento de protótipos que permitiram avaliar a compatibilidade de materiais, identificar os custos de transporte etc.

  • Resultados: Na primeira etapa do empreendimento, foram erguidos dois alojamentos para 260 pessoas e um prédio central, somando 5 mil m². Tudo isso em apenas seis meses.

De acordo com os engenheiros da construtora Sequência, responsável pela obra, os sistemas industrializados permitiram reduzir drasticamente a quantidade de entulho gerado. Dos 53 contêineres de material de construção transportados até o local da obra, apenas meio retornou à cidade na forma de entulho.
A construção industrializada também reduziu a quantidade de mão de obra em aproximadamente 40%, em comparação a uma construção tradicional.

3. Escolas de educação infantil – Belo Horizonte, MG

Industrialização_Escolas em BH_crédito divulgação Inova BH
A parceria público-privada firmada entre a prefeitura de Belo Horizonte e a Inova BH culminou na construção de 46 unidades de educação infantil. Voltadas a alunos de até seis anos de idade, as escolas possuem 1.100 m² de área construída distribuídos por dois pavimentos. Cada unidade tem capacidade para receber até 440 alunos.
  • Situação: O prazo para a construção das escolas era de apenas 36 meses. Também era preciso respeitar a tipologia padrão utilizada nas escolas da cidade, com vários recortes e curvas. A técnica de execução precisava, ainda, garantir determinado padrão de qualidade e proporcionar baixo custo de manutenção/operação.
  • Solução: O empreendimento foi viabilizado tendo o steel frame como método construtivo. A estrutura é composta por perfis leves de aço galvanizado formados a frio com 95 mm de espessura espaçados a cada 40 cm entre os montantes, fixados com parafusos autobrocantes também galvanizados.

Os fechamentos externos foram executados com placas cimentícias revestidas com pastilhas cerâmicas. Internamente as vedações são em chapas de drywall preenchidas com lã mineral para melhor desempenho acústico. A cobertura possui treliças, ripas, terças e caibros estruturados em LSF, onde são fixadas e apoiadas telhas de PVC. As instalações prediais hidráulicas utilizam PEX (polietileno reticulado).

  • Resultados: De acordo com os engenheiros da Odebrecht Infraestrutura, responsáveis pela obra, a industrialização das principais etapas do processo construtivo permitiu reduzir o prazo de execução da obra e agregou qualidade dimensional.

Também houve redução de mão de obra empregada. No pico das obras foram cerca de 700 operários atuando simultaneamente. Esse contingente equivale a aproximadamente a metade do que seria necessário se tivesse sido empregado uma metodologia construtiva com concreto moldado in loco e alvenaria.

4. Torre INC – Itu, SP

Trata-se de um empreendimento comercial com 15 pavimentos, sendo dois subsolos. A arquitetura de linhas contemporâneas teve como principal premissa a flexibilização do layout interno dos pavimentos tipo, que podem ser subdivididos em oito conjuntos de escritórios ou forma um open space com 440 m² de laje privativa.

  • Situação: Segundo o arquiteto e incorporador Sérgio Sampaio, a opção pelos sistemas construtivos industrializados se deu pela vontade de racionalizar ao máximo a obra.
  • Solução: O empreendimento utilizou estruturas mistas (aço + concreto). Os pilares de aço foram revestidos de concreto, enquanto as vigas de aço receberam proteção passiva através de argamassa projetada. As lajes foram executadas em steel deck. Subsolos e térreo empregaram laje painel treliçada maciça.

As fachadas foram executadas em steel frame. Os fechamentos internos foram construídos com drywall duplo. Já o fechamento externo se deu com chapas cimentícias envelopadas por membrana que protegem a fachada das intempéries e auxiliam no desempenho termoacústico da edificação. Para o revestimento foi utilizada massa acrílica branca para melhor reflexão do calor.

  • Resultados: A combinação de sistemas construtivos industrializados permitiu máxima redução de desperdícios. Além disso, possibilitou maior controle de custos em função da maior precisão.

Conclusão

Os exemplos que citamos acima mostram que a industrialização na construção não é um objetivo distante. Muito pelo contrário. É aplicável em grandes empreendimentos, como o Parque da Cidade, em situações desafiadoras, como a de Coari, e também em pequenos edifícios, como a Torre INC.

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