Na obra, a tecnologia é bem-vinda, mas não se basta

Alonso Mazini Soler

Escrito por Alonso Mazini Soler

1 de agosto 2018| 4 min. de leitura

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Passada a tormenta que assolou o segmento de negócios e a quase extinção das grandes obras de infraestrutura nos últimos anos, retomei esta semana o trabalho em uma grande obra rodoviária de dimensões exponenciais no histórico nacional – o maior túnel, a maior extensão de túneis, etc.
Curioso e apaixonado pelo trabalho no canteiro e pelo projeto em si, procurei analisar as diferenças desde a última vez que calcei as botas de EPI há dois anos.

Governança e Compliance

Em primeiro lugar, é nítida a observação de processos relacionados à governança e ao compliance – a rigorosidade dos detalhes e das exigências, a transparência das negociações, o cuidado com as relações pessoais e o extremo profissionalismo aplicado às contratações. Seriedade e respeito ao bem público e seus benefícios à sociedade que nunca deveriam ter faltado.

Tecnologia disruptiva

Foi maravilhoso perceber a obra pela ótica da utilização de novas tecnologias. Equipamentos extremamente sofisticados, importados e caros realizam de modo autônomo o trabalho que antes era feito por dezenas (centenas?) de profissionais contratados. Salas de comando e controle que monitoram de modo remoto o avanço e a qualidade da obra a partir de dados emitidos por sensores remotos e drones que se revezam na supervisão do desempenho.
Sistemas complexos que analisam dados coletados, avaliam automaticamente condições adversas e emitem alertas técnicos e de gestão – sinalizadores coloridos, gráficos, curvas e sons que antes eram elaborados e processados por profissionais experientes, agora emergem dos monitores indicando com grande precisão o que deve ser feito a seguir. Um novo mundo construído à semelhança das novas regras e exigências da atualidade. Mais limpo, direto, rápido e menos sujeito as subjetividades e intemperanças humanas.

Tinha gente também!

Mas não pensem que só percebi mudanças inovadoras disruptivas. Lá estavam, ainda, mais de 2 mil trabalhadores, de carne, osso, botas e capacete. Tal como sempre convivi, trabalhavam incansavelmente instalando, conduzindo e posicionando equipamentos, manuseando ferramentas, carregando, puxando, cavando, batendo, executando tarefas de diferentes níveis de complexidade, sinalizando a segurança, gerindo os recursos, supervisionando, tomando decisões.

A obra do futuro

Os novos ares do novo canteiro me fez reavaliar minha visão sobre o futuro. Erra quem acredita que a obra do futuro se limitará apenas à utilização de tecnologia. Dificilmente a máquina será capaz de trabalhar em equipe, acumular experiência, produzir e utilizar o conhecimento tácito, se motivar, pensar e agir como o trabalhador profissional, humano!
Erra quem aposta apenas nas mudanças promovidas apenas pelas novas gerações digitalmente nativa e empoderadas pelas inovações tecnológicas disponíveis. Há que se valorizar a experiência de quem já fez um dia e a sua capacidade de lidar com os imprevistos. Uma grande obra de construção de infraestrutura não se limita ao algoritmo previsível de um programa de computador.

Por:
Alonso Mazini Soler, Doutor em Engenharia de Produção POLI/USP, Professor da Pós Graduação do Insper, da FIA e da Plataforma LIT Saint Paul. Sócio da Schédio Engenharia Consultiva – alonso.soler@schedio.com.br
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