Construções acessíveis: responsabilidade pública e privada

Tomás Lima

Escrito por Tomás Lima

4 de abril 2018| 11 min. de leitura

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Construções acessíveis: responsabilidade pública e privada

Você sabia que, além das limitações por idade, atualmente, aproximadamente 650 milhões de pessoas vivem com alguma deficiência?

Acredito que você irá concordar comigo quando digo que as construções acessíveis nunca estiveram tão em pauta quanto atualmente. Por isso, devem ser uma preocupação cada vez mais constante para construtoras e incorporadoras, na tentativa de proporcionar uma qualidade de vida melhor para todos.

Quer saber como é a regulamentação dessas construções pelo mundo?

construções acessíveis
Agência Brasil/Divulgação

Construções acessíveis pelo mundo

No início dos anos 2000, algumas cidades começaram a sofrer adaptações em sua infraestrutura urbana para incluir socialmente os cidadãos com deficiência.

Europa

Tomando como base a Suécia, que é considerada como uma das nações mais preparadas do planeta quando o assunto é acessibilidade, esse fato fica mais do que claro. Em Estocolmo, por exemplo, existe uma equipe que trabalha na questão da acessibilidade junto a representantes da sociedade por meio de reuniões mensais e diálogos com as autoridades.

Assim, praticamente todas as calçadas são acessíveis, com pisos táteis, corrimão e sinalização em todas as escadas, além de rampas por todos os lugares. Também contam com alertas eletrônicos que indicam os destinos dos transportes públicos, ônibus e metrôs equipados com elevadores, entre outras medidas.

A política inclusiva na Europa é tão forte que existe até um prêmio chamado “Access City of the Year”, promovido desde 2010, que premia sete cidades que vêm trabalhando em prol da acessibilidade para seus habitantes. Cidades como Manchester, na Inglaterra, Liubliana, na Eslovênia e muitas cidades nórdicas ganham destaque.

Quer saber mais? Assista ao vídeo mostrando a qualidade das construções acessíveis na Suécia:

https://vimeo.com/129787301

América

Já nos Estados Unidos, a cidade de Nova Yorque foi listada pela AFB (Fundação Americana para Cegos) como um dos melhores lugares para se viver com deficiência visual no país. Segundo a instituição, a cidade possui um sistema de transporte público extremamente acessível, o que permite aos moradores o acesso a atividades sociais e culturais a qualquer momento.

A cidade de Seattle também não fica atrás, aparecendo com frequência no topo das listas de cidades mais acessíveis. Tem uma área metropolitana bastante concentrada, e as linhas de metrô, diferentes de cidades com urbanizações mais antigas como Nova York e Boston, já foram planejadas dentro dos padrões mais modernos.

Comparado ao Mercosul, a lei brasileira ainda é a mais abrangente, seguida pela lei argentina, que prevê tanto a incorporação de conceitos de acessibilidade no projeto arquitetônico na esfera pública e privada quanto a adaptação de espaços e incentivo à reforma de equipamentos de transporte público, reserva de assentos e fila preferencial.

Ásia

Já na Ásia, podemos dizer que uma das cidades mais acessíveis é Singapura. Por lá foi implantado um código universal de acessibilidade que tirou as barreiras físicas da cidade. Tudo pode ser feito de metrô, que tem elevadores especiais para cadeirantes. As ruas possuem calçadas táteis, e os semáforos são munidos de avisos sonoros para facilitar a locomoção.

Construções acessíveis no Brasil

Sabemos que o Brasil, aos poucos, supera algumas dificuldades, tanto na economia quanto na política. Mas, em relação à inclusão social de pessoas com deficiência, o cenário poderia ser melhor. Enquanto as políticas públicas e o investimento na acessibilidade são realidade na Suécia há quase 20 anos, aqui estamos apenas começando a ver alguns resultados.

Segundo dados do IBGE, 45,6 milhões de pessoas têm algum tipo de deficiência. Isso corresponde a 23,91% da população brasileira. No entanto, ainda não existe no Brasil uma cidade que possa ser apontada como modelo de acessibilidade. O que existem são soluções pontuais e não planejamentos amplos no âmbito das cidades.

Em todas as cidades, temos problemas sérios de pavimentação das calçadas. Também há carência de sinalização tátil direcional e de alerta, sinais sonoros e informações em braile para as pessoas cegas. Para pessoas de baixa visão, faltam placas ou painéis de informação com letras grandes ou contraste de cor.

construções acessíveis
Divulgação

A manutenção dessas sinalizações também não é frequente e vai se deteriorando com o tempo. Assim, além do desenvolvimento da cultura de construções acessíveis no País, também é necessário conscientizar o próprio governo e autoridades para a devida fiscalização e cobrança.

Fiscalização

A fiscalização ainda é muito escassa, havendo pouca checagem ao atendimento da legislação e das normas regulamentares. Nosso País possui leis de primeiro mundo em relação aos direitos de pessoas com deficiência, mas seu cumprimento deixa a desejar.

Segundo Mauro Nadine, diretor financeiro da Associação de Deficientes Físicos do Paraná, os órgãos de fiscalização existem, mas é necessária a criação de conselhos que envolvam a sociedade para provocar a mudança. 

A seguir, vamos conhecer as leis que preveem requisitos de acessibilidade.

Legislação

Levando em consideração os preceitos do Desenho Universal, voltados à eliminação de barreiras arquitetônicas, o grande objetivo é respeitar as diferenças existentes entre todas as pessoas e garantir a acessibilidade a todos em um ambiente. O objetivo é que qualquer pessoa possa entender e usar o local, de forma simples e intuitiva.

Com base nisso, o governo brasileiro lançou:

Estatuto da Pessoa com Deficiência, lei 13.146.

Assegura condições de igualdade, além dos direitos e liberdades fundamentais às pessoas com deficiência. Na prática, porém, sua aplicação é pouco promissora.

Lei 10.098

Determina formas de concepção dos elementos de urbanização, bem como vias públicas, parques e demais espaços de acesso público, mobiliário, brinquedos, veículos e outros equipamentos de uso público comum.

Todos os parâmetros para projeto e instalação desses recursos devem ser orientados e atendidos de acordo com as normas técnicas emitidas pela ABNT, principalmente pela norma NBR 9050.  

ABNT NBR 9050

Esta norma é bastante extensa e exigente no sentido de nacionalizar a linguagem técnica, para que qualquer pessoa com deficiência possa acessar todos os espaços comuns sem encontrar dificuldades na comunicação e sinalização.

De acordo com esta norma, todas as edificações, construídas ou em construção, precisam ter como base o princípio de desenho universal (como explicado anteriormente). Isso permitirá a livre mobilidade do usuário, independentemente do tipo ou do grau de sua deficiência.

Você pode estar se perguntando: mas na prática, o que isso significa?

Significa que todos os ambientes de uso coletivo devem ser adaptados para o portador de deficiência, como:

  •        Garagens;
  •        Portarias;
  •        Halls de acesso;
  •        Salas e salões;
  •        Banheiros;
  •        Praças;
  •        Piscinas;
  •        Saunas;
  •        Quadras esportivas;
  •        Academias.

Assim, os empreendimentos precisam ter calçadas projetadas com rampas e piso tátil de alerta para possíveis obstáculos que possam ferir um deficiente visual. Portas, corredores e elevadores também precisam ter dimensões adequadas para facilitar a locomoção de todos, assim como a circulação de pedestres.

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Instalação de piso tátil (Crédito: Avance Acessibilidade/Divulgação)

Oportunidades para construtoras

A acessibilidade na Construção Civil envolve todas as disciplinas que trabalham projetos de obra: arquitetura, engenharia civil, elétrica, eletrônica, mecânica e hidráulica.

Afinal, temos de ter interruptores, campainhas, interfone e telefones, quadros, registros, válvulas de descarga, lavatórios e pias, comando de janelas, maçanetas de portas e torneiras com alturas e mecanismos adaptados para atender ao portador de deficiência. Além, claro, de peças de mobiliário com desenho exclusivo, como balcões, cadeiras, bancos, mesas, etc.

Desta forma, o investimento em acessibilidade pode ser visto como um simples fator obrigatório a ser cumprido, ou transformado em um diferencial competitivo. As empresas que possuem essa visão costumam passar uma imagem positiva ao mercado, ao mostrar que essa preocupação realmente existe e que não é executada simplesmente em função da legislação.

Segundo Sergio Yamawaki, membro da Comissão de Acessibilidade do CREA-PR, conforme publicado na Gazeta do Povo,  estima-se que o custo para implantação desses itens encarece menos de 1% do valor final da obra. Entretanto, adaptar um empreendimento que já está pronto pode elevar o orçamento da obra em até 25%. Além disso, com os requisitos de acessibilidade, o imóvel tende a valorizar cerca de 15%.

Em suma, além dos benefícios sociais, investir em construções acessíveis poderá trazer um retorno maior aos projetos de construção.

Quer saber mais? Dê uma olhada neste checklist de acessibilidade que preparamos para você não esquecer de nenhum item.

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